segunda-feira, 28 de julho de 2008

Sumiço de bolacha mobiliza seis Estados dos EUA

Poucos produtos alimentícios podem inflamar toda uma ilha, quanto mais toda uma região. Mas são poucos os comestíveis que têm história e tradição comparáveis à dos biscoitos salgados Crown Pilot.

Um biscoito branco e retangular, cuja consistência fica a meio do caminho entre a de uma bolacha água e sal (mas sem sal) e a dos antigos biscoitos usados em navios a vela, o Crown Pilot há muito é alimento essencial em muitas casas da Nova Inglaterra.

A Nabisco, que fabricava a marca, a tirou de produção em 1996, mas depois de meses de protestos dos leais consumidores dos Crown Pilot - muitos dos quais moradores da ilha de Chebeague, ao largo da costa do Maine -, ela decidiu relançar o biscoito em 1997, em uma caprichada cerimônia a bordo de um navio ancorado em Boston.

A situação estava salva, muita gente acreditou, mas alguns meses atrás a Kraft Foods, que tomou o controle da Nabisco, uma vez mais suspendeu a fabricação do biscoito. Agora, as pessoas de Chebeague e do resto do Maine estão unindo as tropas uma vez mais, e lançaram até mesmo a idéia de um evento de caridade cuja arrecadação seria utilizada como forma de financiar a campanha pelo relançamento do Crown Pilot.

"E se os moradores do sul tivessem de passar sem sua canjica? Com certeza eles se rebelariam", disse Sylvia Ross, moradora da ilha, que come os biscoitos Crown Pilot praticamente desde que nasceu. "Como é que agora, de um momento para o outro, nos dizem que não podemos mais comer o Pilot?" A campanha pela salvação do Crown Pilot está uma vez mais sendo comandada por Donna Damon, que trabalha como professora substituta em Chebeague. O objetivo, disse Damon, é convencer a Kraft Foods a ou relançar o biscoito ou fornecer a receita a uma padaria local, que poderia produzir e vender o Crown Pilot.

"Pessoas de toda a costa têm me telefonado", disse Damon. "É o único assunto de que elas falam, agora. Já conseguimos trazê-lo de volta uma vez. E temos a dedicação e a tradição necessárias a fazê-lo de novo¿. No entanto, a Kraft Foods não compartilha desse desejo. "Não temos planos de recolocar o produto em produção", disse a porta-voz Laurie Guzzinati.

Guzzinati informou que a demanda pelos biscoitos Crown Pilot havia caído à metade do volume que apresentava 12 anos atrás. De acordo com artigos de jornal sobre a suspensão do produto, em 1996, a empresa vendia cerca de 110 mil kg de Crown Pilot ao ano.

"Infelizmente, não fabricamos mais os biscoitos Crown Pilot", disse Guzzinati. "As dimensões de nossos negócios com o produto caíram tanto que fabricá-lo se tornou inviável. Já sabemos que o pessoal da região destaca que é importante ter uma base leal de compradores, mas mesmo na Nova Inglaterra a demanda estava em queda".

Mas não tente dizer isso aos moradores de Chebeague, uma pequena ilha cuja única conexão com o continente é uma balsa que cobre o trajeto em 15 minutos. "Em Chebeague, o Crown Pilot é um alimento básico", disse Ross. "Ele passa de geração em geração. São os biscoitos Pilot que as pessoas usam e transmitem em suas receitas para chowders e cozidos de peixe".

Joan Robinson, que morou a vida inteira em Chebeague, próxima à cidade de Portland, explicou a importância do Crown Pilot para a área: "Algumas pessoas perguntam por que não usamos biscoitos água e sal comuns. Mas isso não funciona. Eles não servem para fazer um bom chowder".

O sócio gerente do Chebeague Island Inn, Ed Jarrett, concorda. Ele planejou todo o cardápio de jantar de sua pousada em torno dos biscoitos Crown Pilot ¿todos os recheios usados na preparação de frutos de mar pela cozinha do estabelecimento incluem o biscoito, que também é a base das cinco sopas que o estabelecimento oferece.

"Isso complica muito o meu planejamento", disse Jarrett. "O biscoito estava na receita de nossas ostras assadas e recheadas, de nosso arenque recheado, de todas as nossas sopas. Eu quis incluir a história da ilha e os biscoitos Crown Pilot em nosso cardápio, mas minha visão terminou destroçada".

Jarrett está pensando em doar parte do faturamento de um evento de caridade no qual as crianças da ilha construirão um farol de areia de oito metros de altura à campanha pelo retorno do biscoito. "Se tivermos de organizar uma campanha telefônica com mil pessoas ligando para a Nabisco, pode estar certo de que o faremos", disse Jarrett. "Faremos tudo que for necessário para trazer de volta o biscoito".

May Hall e outros moradores já estão telefonando. "A telefonista me perguntou de onde eu estava falando, e comecei a soletrar Chebeague, mas ela já sabia como escrever", diz Hall. Os moradores também estão tentando freneticamente reproduzir a receita em suas cozinhas - o ingrediente secreto é o melaço, afirmam - mas sem muito sucesso até o momento.

Cal Hancock, da Hancock Gourmet Lobster, que usava o biscoito Crown Pilot em sua receita de chowders e vendia o produto em seu site, esgotou seu estoque (a US$ 3,69 por pacote) menos de 24 horas depois que a notícia sobre o desaparecimento do produto começou a se espalhar pela região.

"A coisa que eu mais recordo sobre o Crown Pilot é que meu pai às vezes acordava no meio da noite, descia à cozinha e comia um Crown Pilot com manteiga de amendoim", conta Hancock. "Todo mundo tem sempre pelo menos um pacote de Crown Pilot em casa, disso você não precisa duvidar. Eles não são assim tão saborosos, mas tenho um pacote em casa e me delicio com eles".

Fonte: The New York Times
noticias.terra.com.br/imprime/0,,OI2947941-EI1141,00.html

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